O PALITO

Na crise de falta de homem em que o mundo anda, aquelas amigas resolveram sair numa bela noite.

– Vamos para a balada! Disse uma delas.

– Quem sabe não é hoje que vamos encontrar nosso “príncipe encantado”? Falou a outra.

– Estou tendo ótimos presságios! Afirmou a terceira.

E lá foram, animadas, para aquela casa noturna, dançar.

baile

Como o dinheiro estava curto e já tinham que pagar ingresso, dividir estacionamento (quanta roubalheira!), elas pediram um refrigerante que teria que fazer o favor de durar até o final da noite.

Jantar, nem pensar!

Primeiro porque iria a grana da semana e segundo porque ficaria com hálito de comida e como dançar juntinho cheirando molhos e temperos?

Então começa a investigação propriamente dita.

– Tá vendo aquele ali? Mostra uma delas. O cara é velho e arruma uma mocinha que podia ser sua neta!

– E aquela mulher lá? Aponta a outra. Com aquele homem horrível!

– Pelo menos ela tem namorado… fala a última fazendo beicinho.

E a casa vai lotando e elas a olhar para todos os lados.

– Parece que não existem mais homens sozinhos! Observa uma delas. Todos já tem donas…

– Isso sem falar na enxurrada de mulheres que está entrando! Olhem só a porta!

– Nem quero ver!

Nisso, atraídas como por um imã, aqueles três pares de olhos críticos, caem numa mesma mesa.

Elas olham, se entreolham e tornam a observar atentamente.

O homem recém chegado sozinho, num terno m a r a v i l h o s o, senta-se enquanto o garçom , mais do que solícito, lhe entrega o cardápio.

Ele abre, lê, chama educadamente o garçom e faz o seu pedido.

E as três ali, boquiabertas, sem perder nadica de nada.

– Que homem chique!

– Bonitão!

– Tão educado!

O engraçado seria se ele viesse até elas e convidasse uma para dançar!

As outras iriam ficar arrasadas enquanto a escolhida ganharia a noite!

Isso é o que passava pela cabeça das três enquanto não tiravam os olhos de cada movimento daquele pobre ser escolhido.

E lá vem o jantar e ele, como se estivesse sozinho no mundo, vai degustando vagarosamente cada garfada.

– Mas ele realmente é perfeito! Diz a mais velha.

– Um gato! Diz a outra.

– Nossa, gente, será que ele é de verdade mesmo? Pergunta a terceira.

E, terminado o jantar, o garçom volta para retirar os pratos e aquele homem se recosta no espaldar da cadeira, aí sim observando à sua volta.

Parece que, finalmente, ele vai se preparar para escolher alguém para dançar.

As amigas nem piscam!

É quando nosso herói pega um palito (isso mesmo, Danuza, um PALITO!)  e começa a fazer a limpeza com sua boca aberta.

De bocas abertas, além dos olhos, é que ficaram nossas amigas!

Viraram para o outro lado e o encanto acabou…

Tudo!

Menos palito!

Nem pensar!

palito

 Imagens: 1. significado.sonhos.nom.br; 2. historiasdelari.blogspot.com

FAZ DE CONTA

fazconta

Faz de conta que sou feliz.

Que não ouço as notícias,

que não vejo as imagens,

que não existem crianças

passando fome, enjeitadas,

pobreza, analfabetismo,

desemprego e sequestro,

morte e calamidade.

—–

Faz de conta que sou feliz.

Que não percebo seu jeito,

que não sinto as mudanças

não vejo a indiferença,

a falta de sintonia,

de tato, de companhia,

do final se aproximando,

sem querer, me aprisionando.

—–

Faz de conta que mudei tudo.

Que sou forte, poderosa.

Às crianças dei um lar,

comida, escola, vontade

de aprender, de ser alguém.

Empreguei homens, mulheres

e dei um teto também.

—–

Faz de conta que mudei tudo.

Vi você se aproximando

abri meus braços e neles

você se ajuntou sorrindo.

Olhou, como já não fazia,

em meus olhos lá no fundo

e tudo foi paz, alegria

e seguimos pelo mundo.

casal

(Do meu livro Um Pouco de Mim)

Imagens: 1) gestaoadvbr.wordpress.com 2) angela.mulher.zip.net

TRÊS MULHERES ESPECIAIS

Trabalho há anos numa grande empresa e é interessante observar a diferença que existe entre as pessoas.

E nem sou psicóloga…

Primeiro passei a notar a Halina que é uma moça bem jovem e bonita.

Num meio em que, muitas vezes, as pessoas nem se conhecem e mal se cumprimentam, ela oferece o seu “bom dia” mavioso.

Isso mesmo: mavioso, de suave, terno, afável.

Quase vejo notas musicais saindo desse seu bom dia que ela oferece a todos, indistintamente.

– BOM DIA!

notas musicais

A segunda e não menos importante, é a Ana Carla.

Estávamos passando por um período de grande estiagem.

A grama, flores e arvorezinhas do nosso jardim estavam secas e tristonhas.

Aí, uma manhã, dois empregados da manutenção, chegaram com sua máquina Vap de lavar calçadas e começaram a esfregar o pátio demoradamente.

Algumas horas depois ela chega transtornada pedindo que parassem com aquilo, que era muita água sendo desperdiçada.

– São ordens! Responderam eles, continuando.

Ela então vai até a administração e conta o problema.

Mais tarde, ela que sempre se mostrou calma, contou-me que não tinha sido atendida, mas que tinha deixado registrado o seu protesto.

– Não adiantou nada! Disse ela tristemente.

lavadora VAP

Engano seu, minha amiga, são exemplos como o seu que nos fazem parar e pensar!

E a terceira é a Solange.

Nem trabalha mais conosco, mas talvez se soubessem de suas atitudes teria sido mais valorizada.

Nós usamos copos descartáveis para tomar água.

Como eles são muito frágeis, muitas vezes pegamos dois copos para ficar mais firme.

Um belo dia, ela chegou com um presente para todos do setor: um porta copos de plástico duro, perfeito para ser colocado o outro dentro.

– Assim não será preciso usar dois. Um só basta! Ela falou.

Em outra ocasião, na cozinha que fica ao lado, várias canecas e chaleiras ferviam água para o café.

A zeladora que o preparava não estava por ali.

Muitos tinham passado sem fazer nada.

Ela entrou, desligou a chama do gás para não ficar fervendo à toa.

Ninguém viu… só eu, mas foi um exemplo maravilhoso de alguém que, sem se mostrar, fez a sua parte.

chaleira

E eu fiquei pensando com meus botões: ainda bem que existem pessoas como essas mulheres que oferecem sorrisos, que se importam com o meio ambiente, que sabem a importância do poupar!

Nem tudo está perdido!

No final do túnel, existe luz!

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Imagens: 1) pensando.dihitt.com; 2) http://www.americanas.com.br; 3) http://www.robsonpiresxerife.com; 4) andretaka.wordpress.com

 

MULHERES SOZINHAS

Como ainda estamos celebrando o Dia da Mulher, segue essa poesia que fala da mulher sozinha por opção, um direito adquirido!

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Mulheres Sozinhas

Eu as vejo sempre

em todos os lugares.

Nas ruas

andando com pressa,

no volante do carro,

nas mesas de bares.

—–

São muitas

e de todas as idades.

Correm nos parques,

jogam nos bingos,

dançam nas festas,

vão orar aos domingos.

—–

Faço parte delas.

Dessas mulheres sozinhas.

Que lutaram, suaram,

que curtem a liberdade,

que preservam a intimidade,

que decidiram por si.

—–

Mas à noite, no quarto,

quando vou me deitar,

quero o cheiro, o braço,

do homem que escolho,

como travesseiro,

prá dormir e sonhar…

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(Do meu livro “Um Pouco de Mim”, em 1999)

Imagens: 1) juartenapraia.blogspot.com; 2) patycarlafreitas.wordpress.com

 

A MÃE QUE VIROU LOBO

Estávamos, há muitos anos atrás, em uma pequena cidade de Minas onde o trilho do trem cortava toda a cidade.

Ele vinha apitando forte nas curvas, menos na Sexta Feira Santa quando não se podia falar alto, nem assobiar, muito menos ligar o rádio em casa.

Assobiar o vovô não deixava mesmo!

– Mulher distinta, não assobia!

E eu que estava longe de ser mulher e nem sabia o que era distinta, apenas obedecia sem graça.

E lá ia o tempo passando, devagar, porque tudo ali era sem pressa.

Foi quando mamãe resolveu brincar “de mentirinha” comigo.

– Sabe, querida, que às vezes eu viro lobo?

– Como assim? Perguntei.

– Eu vou andando pelos trilhos até aquela curva e quando volto, sou um lobo.

Fiquei pensando, pensando e resolvi que queria ver.

– Quero ver, mãe, se isso é verdade!

– Pois então veja, mas não vale chorar!

E lá fiquei eu, na beira do trilho enquanto ela desaparecia na curva.

Nem lembro bem o que se passou na minha mente àquela hora: medo, angústia, dúvida…talvez!

E ela voltou.

lobo mau

Era um lobo, andando sobre duas pernas, com as roupas de minha mãe mas a cara de um lobo.

Horrorizada, corri até ele abraçando sua cintura e gritando:

– Não, mamãe! Não quero você lobo! Por favor! Vire minha mãe outra vez!

E mamãe me abraçava sorrindo dizendo:

– Mas sou eu, filhinha, sua mãe!

E eu com os olhos fechados, respondia:

– Não! É o lobo! Volte, mamãe!

E assim ficamos abraçadas, durante muito tempo!

mãe e filha

Muitos e muitos anos depois, quando nos reunimos para conversar, sou alvo das risadas de todos e ainda juro que vi minha mãe virar lobo.

E ela quando perguntada, sorri enigmaticamente e sacode a cabeça como quem diz:

– Quem sabe?

(Do meu livro Confidências ao Meio Dia, com um segundo título: O PODER DA SUGESTÃO)

Imagens: 1) http://www.popscreen.com; 2) galeria.colorir.com

 

MINEIRA

Ah, mineira, se soubesses

como é lindo teu andar…

Não és “garota de Ipanema”

nem ao menos tens um mar,

mas teu corpo tem o cheiro

dos quitutes, das quitandas,

do tempero brasileiro

que nos levam a sonhar.

És a rima, és a prosa,

pura e casta, hospitaleira,

a donzela valorosa

de tradicional família

que sobe ladeira

de ruas estreitas,

que vai à Igreja

rezar fervorosa.

És ilustre, tens história.

Na política és ardilosa.

És rica, dona de pedras

das minas do teu Estado.

Tens a música no sangue,

tens na língua o desacato,

tens no agrado teu recado,

tens na alma teu pecado.

Teu sorriso matreiro,

teu olhar zombeteiro,

teu gingado brejeiro

me fez prisioneiro:

não sei mais quem sou.

Do meu livro “UM POUCO DE MIM”

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