SERÁ VERDADE MESMO?

Escrevi esse conto em 27 de setembro de 2021.

Um pequeno conto que poderá se tornar verdadeiro daqui alguns anos…

SERÁ VERDADE?

E aquela velha senhora sentou-se em sua cadeira de balanço e começou a lembrar. Devagar, porque agora em sua vida, não existia pressa para nada.

Seus bisnetos irrequietos não aguentavam a espera para ouvi-la contar histórias do seu passado distante.

– Bisa, conta logo! Pediu o menino de cabelos cacheados.

– Vai ser de medo? Não gosto de histórias que me fazem ter medo. Reclamou a bisneta mais velha.

– Vou contar uma história verdadeira que aconteceu há muito tempo atrás quando eu tinha a idade de vocês.

E ela começou e o silêncio reinou.

Era somente sua voz embalada no vai e vem da sua cadeira.

Num belo dia como outro qualquer, surgiu um mal em nosso mundo. Ele era invisível e muitas vezes mortal.

Tudo parou!

As pessoas não podiam sair de casa, se encontrar com amigos e muito menos abraçar porque esse vírus estava rodeando as pessoas para apanhá-las de jeito.

As escolas fecharam bem como as igrejas, parques, lojas, restaurantes, tudo foi fechado.

– Nossa, bisa, e como vocês faziam? Ficavam presos em casa? Perguntou o mais curioso.

Muitas vezes sim. Respondeu a bisavó. Sair significava não ver esse inimigo que podia entrar pelo nariz e boca nos deixando doentes. As pessoas não podiam ir ao trabalho e começou faltar dinheiro para comprarmos alimentos. Éramos obrigados a usar máscaras.

– O que? Tipo Homem Aranha? Perguntou o menorzinho.

– Mais ou menos, continuou a velhinha, e lavávamos as mãos centenas de vezes ao dia e ainda usávamos álcool nelas e nos móveis, fechaduras, pacotes. Tudo era muito difícil.

– Bisa, muita gente morreu por causa disso? Perguntou tristemente a menina.

– Sim, respondeu a bisa, milhares e milhares! Cada manhã chegavam mais notícias de pessoas contaminadas e os hospitais não davam conta de cuidar de tanta gente. O desespero só crescia!

Até que um dia, a vacina foi inventada!

– Ainda bem, que legal! Todos falaram juntos.

– Verdade, queridos! Sorriu continuando a contar. Mas ela foi vindo de pouquinho em pouquinho e todos nós enfrentávamos fila no desejo de sermos vacinados e ficarmos tranquilos.

Foi uma alegria quando todo o mundo pode tomar a vacina e por o vírus prá correr!

– Que sorte a nossa, né bisa, por não termos mais esse vilão por perto! Ponderou o mais velho.

Sim, falou a bisavó, nossa fé e esperança de que tudo iria passar, foi nossa salvação. É por isso que agora vocês podem usufruir dessa paz e tranquilidade em que o mundo se encontra.

Gostaram da história?

– Sim, muito! Obrigado, bisa! Respondeu o mais esperto que ao sair com os outros para as brincadeiras no quintal, pergunta: vocês acreditaram na história que a bisa contou? Acham que aconteceu tudo aquilo mesmo? Não sei não…

E a bisavó que ouvia tudo pensou com seus botões, será mesmo?

Imagens: 1) dreamstime; 2) Vecteezy; 3) BC boa consulta

“POIS ASSIM COMO POR UMA SÓ OFENSA VEIO O JUÍZO SOBRE TODOS OS HOMENS PARA CONDENAÇÃO, ASSIM TAMBÉM POR UM SÓ ATO DE JUSTIÇA VEIO A GRAÇA SOBRE TODOS OS HOMENS PARA JUSTIFICAÇÃO DE VIDA.” Romanos, 5- 18

MINHA AVÓ MARIA

Ah, como me lembro dela!

Maria Luiza Pinheiro Novaes de Camargo, um nome extenso para aquela mulher baixinha, gordinha, olhos azuis penetrantes, cabelos curtos bem branquinhos e que chamávamos de tão somente, vó Maria.

Mineira de Jacutinga, nasceu em 1899.

Era enérgica e quando éramos pequenos, a lembrança que me vem dela era de muito brava conosco que passávamos as férias em sua casa.

Mas o momento que mais recordo com muito amor, é o que descrevo a seguir.

Cenário: uma sala de visitas com alguns sofás antigos e no canto, uma cadeira de balanço.

Era a sua cadeira.

Lá ela se sentava depois das tarefas diárias e se balançava.

Seus olhos azuis meio que se fechavam e eu sentia que ela começava a viajar por seu passado, lembrando fatos e coisas meio perdidas nas gavetas do pensamento.

Aí eu me sentava em um banquinho bem próximo a ela, já adivinhando o que viria a seguir.

– Menina, ela perguntava, porque você gosta tanto assim de poesia?

E eu respondia:

– Ah, vó, gosto tanto de ouvi-la declamando…quem sabe um dia eu também escreva e decore poesias como a senhora?

E ela continuava seu balanço como se ele a levasse lá para dentro dos seus guardados…

E começava com “A Doida”.

Era um poema longo que contava a triste história de uma mulher presa em uma torre, mas que sentia saudades de sua vida anterior e terminava com sua morte: “rola a doida pelo chão…”

Nunca encontrei nada sobre esse poema, mas me recordo do início:

“Lá nas brumas do poente

mal desponta o astro do dia,

quando um sabiá plangente

desprende suave melodia.

 

No galho em que pousava

ali bem perto ficava

as janelas gradeadas de sombria prisão

onde triste jazia então,

uma doida encerrada.”

Até aí consigo lembrar, mas o poema vai longe, muito longe…

E ela dizia todos os versos de cor enquanto  continuava seu balançar.

E eu ali, entre admirada e assustada, ouvindo com os ouvidos e o coração.

– Pronto! Terminei! Chega por hoje! Ela falava já mudando o tom de voz.

– Ah, vovó, só mais uma! Prometo! Eu pedia.

E ela recomeçava, balançando, cerrando seus olhos e em silêncio procurando em suas memórias.

Então vinha outra: “Beijos” que começava assim:

“Não queres que eu te beije?

E o beijo é a própria vida!

A invenção mais bela

e sublime do Senhor!”

E aquela menina decorou essa poesia inteira e ainda a diz, de vez em quando, enquanto lembra de sua avó.

Talvez por isso tenha tanta vontade de ter uma cadeira de balanço…

“COROA DOS VELHOS SÃO OS FILHOS DOS FILHOS; E A GLÓRIA DOS FILHOS SÃO SEUS PAIS.” Provérbios, 17- 6.